As viagens de d. Pedro II ao Vale do Paraíba

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Texto de Glauco Souza Santos

Como entender um país sob regime monárquico com todos seus vizinhos sendo repúblicas em pleno século XIX? O que teria de especial esse país para ir contra todas as pressões de um mundo cada vez mais laicizado, racionalista e, por que não, republicano? O imperador d. Pedro II soube como ninguém ir contra todas as tendências e pressões, fortificando e estabilizando o regime implantado por seu pai no Brasil. Durante os 49 anos de seu reinado usou de várias estratégias para buscar legitimar seu poder como monarca, enfrentando as pressões externas, oriundas de seus vizinhos republicanos, e também as internas, como o Exército, os políticos ultraliberais que depois viriam a se tornar republicanos e, principalmente, os poderosos cafeicultores escravocratas.

Visconde e Viscondessa de Tremembé


Base de sustentação da economia e fiéis da balança política do Império, os “senhores do café” auxiliaram d. Pedro II a implantar sua ideia de nação, de identidade nacional e de país. Se outrora trabalharam para legitimar o poder do Imperador, foram eles também um dos responsáveis mais importantes pela sua queda. Dentro desse grupo fundamental para a consolidação e desagregação do regime monárquico, estão os cafeicultores do Vale do Paraíba, escravocratas em sua grande maioria.

O Vale do Paraíba era uma região estratégica para o investimento da monarquia brasileira na legitimação de seu poder, tanto pelo seu poderio econômico, como pelos importantes cafeicultores que aqui residiam e que possuíam amplo poder na política imperial. Nas viagens de d. Pedro II e de sua filha e herdeira do trono, a Princesa Isabel, passar e se hospedar por alguns dias nas cidades do Vale do Paraíba paulista se tornaram, ao longo do tempo, mais do que essencial para legitimar o poder da monarquia perante o poder local. Quais cidades d. Pedro II realmente teria dedicado especial atenção? Com quem teria se encontrado e o que teria acontecido nestas reuniões e nos encontros mais informais como festas, saraus, almoços? Além destas perguntas primordiais é de suma importância questionar sobre quais preparativos foram planejados pela Coroa e pelas elites locais para a recepção e hospedagem de d. Pedro II nessas cidades, observando sempre sob a ótica do uso da simbologia e dos rituais para legitimação do poder monárquico. Qual teria sido a reação da população e das elites locais ao serem impactados por essas ações da Coroa?

Família Imperial


Nessa toada, esta coluna inaugura uma série de artigos sobre as quatro viagens oficiais (1868, 1878, 1884 e 1886) realizadas pela família Imperial à região dos poderosos fazendeiros valeparaibanos. Serão descritos os preparativos, os principais acontecimentos, os fatos pitorescos e, principalmente, todas as mudanças ocorridas nas cidades após serem impactadas por tão ilustre visita.

Em cada cidade visitada restam resquícios da presença do Imperador e da Princesa Imperial até os dias atuais. A longa duração do fascínio exercido pela monarquia no imaginário popular aliado à ritualística produzida pela Corte para a chegada e recepção do monarca foram fatores fundamentais para a criação da imagem que d. Pedro II tem até hoje. Afinal, “é somente na monarquia que rituais e símbolos ganham um lugar oficial” (SCHWARCZ, 2001, p. 7). Como explica Marc Bloch (1993, p. 44), a monarquia é revestida de um maravilhoso mundo simbólico que atua diretamente no imaginário coletivo e está presente há milênios, desde os tempos iniciais da História.

As viagens foram, com certeza, a melhor forma de levar este “maravilhoso mundo simbólico” da monarquia para as distantes localidades do Vale do Paraíba. Era como se a Corte desembarcasse alguns dias naquelas cidades dominadas pelo café, pelo escravismo e pelos “barões”. Nos próximos artigos, será possível perceber como, de início, elas exerceram seu papel fundamental na legitimação do poder do monarca, mas com as tantas mudanças por qual passou nosso país ao longo do 2º Reinado, estas visitas de d. Pedro II e da Princesa Isabel deixaram de surtir o mesmo efeito, fazendo com que os tão ilustres titulares do Vale do Paraíba as aproveitassem para mostrar seu desprezo à monarquia.

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Referências bibliográficas

BLOCH, M. Os reis taumaturgos: o caráter sobrenatural do poder régio, França e Inglaterra. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.

SCHWARCZ, L. M. As barbas do Imperador: D. Pedro II, um monarca nos trópicos. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

 

Veja também:

– 1868: uma Princesa devota – chegada ao Vale

 

[box style=’info’] Glauco de Souza Santos

glauco
É graduado pela Universidade de Taubaté, Mestrando em História Social pela Universidade de Campinas. Trabalha como Professor de História em São José dos Campos – SP.

 

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